O seguro-apagão brasileiro.
No Brasil, após anos de política de abandono do setor produtivo de energia elétrica, no início do ano de 2001 o país aproximou-se de um colapso energético. Em razão dessa aparente insolúvel situação, diversos estados chegaram a arcar com um sistema primitivo de racionamento, deixando, por inúmeras oportunidades, a população desprovida daquela que talvez seja a principal fonte de produtividade da atual sociedade. A despeito de todos os esforços despendidos pelos cidadãos brasileiros, como recompensa o governo federal impôs à população nova oneração, informalmente denominada seguro-apagão. Assim, a partir de março de 2002, nas contas de energia elétrica de quase todos os cidadãos brasileiros encontrou-se estampada a mais nova inconstitucional fonte de renda da União, qual seja, o 'encargo' de capacidade emergencial, quantificado originalmente na ordem de R$ 0,0049/kWh. Apesar de, aparentemente, tratar-se de oneração pouco expressiva, o que se tem verificado na prática, especialmente em relação aos setores produtivos, é que o seguro-apagão pode representar até 10% do consumo mensal de energia elétrica.
Ocorre que, a partir da análise da legislação instituidora do 'encargo' em comento, percebe-se que ela está em completa desconformidade com o ordenamento jurídico vigente, padecendo de vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade. Nesse sentido, fundamental esclarecer que 'encargo' sob o enfoque fantasiado pela União como 'adicional tarifário' (na acepção técnica, preço público), em verdade apresenta todas as características de típico tributo, burlando o basilar princípio jurídico da legalidade tributária (artigo 150, III, da Constituição federal) no que diz respeito a sua instituição.
Por essas e outras razões, o seguro-apagão, autoritariamente imposto à sociedade brasileira, sofre de inúmeras deficiências em sua própria criação, razão pela qual cabe ao contribuinte ingressar com a competente ação judicial, a fim de resguardar seus direitos. Outrossim, necessário ressaltar que, visualizando a plausibilidade da tese acima esgrimada, a Justiça Federal da circunscrição de Porto Alegre vem concedendo algumas liminares em demandas análogas, reconhecendo a ilegalidade da exação examinada.
Adaptado de:
Blasco Allem Nunes
Correio do Povo, 25 de Abril de 2003.